O juiz federal Douglas Camarinha Gonzales recomenda a exclusão do artigo 1.º do projeto que altera a Lei de Lavagem de Dinheiro. A nova redação prevê como lavagem todo ato que oculte proveito econômico decorrente de infração criminal. 'Um investidor que recebe aluguel e não declara ao Fisco tais rendimentos, vindo a reaplicar esse dinheiro na construção comercial, formalmente pode ser acusado de lavagem', adverte Camarinha, da 6.ª Vara Criminal Federal de Lavagem de Capitais e Crimes Financeiros de São Paulo.
O projeto 3443/2008, aprovado pela Câmara, de volta ao Senado, divide juristas renomados, delegados federais e constitucionalistas. Qualquer delito poderá ser classificado crime antecedente para caracterizar lavagem - desde que a ação produza ativos ilícitos. A lei em vigor limita o rol dos crimes antecedentes.
Aos 37 anos, há 12 na magistratura federal e com mestrado em Direito do Estado pela USP, Camarinha avalia que o projeto impõe 'necessária ampliação do rol de empresas e pessoas físicas obrigadas a prestar contas aos órgãos de fiscalização para a prevenção do delito'.
O juiz aprova 'os pontos de prevenção da lavagem', mediante a participação empresarial de entidades civis e da própria sociedade. 'Busca-se menos processos e mais soluções eficientes.'
Alerta que o texto amplia o leque dos que terão de se enquadrar. 'O projeto ressalta, de um lado, o setor financeiro e, de outro, setores que atraem investimento como de objetos de luxo, obras de arte, imóveis e feiras, de agenciamento de atletas profissionais e artistas. Arrola empresas de consultoria, assessoria e auditoria para a compra de imóveis e aplicações financeiras. O projeto alcança sim serviços de advocacia, salvo o setor criminal em razão do postulado constitucional do direito de defesa.'
O juiz anota sobre a responsabilidade das companhias. 'Há um aprimoramento expressivo nacompliance, setor corporativo da empresa que cumpre exigências burocráticas para prover a correta informação às autoridades de movimentação suspeita. Tais entidades vão adotar política de controle de informação, cadastro e controle interno.'
Ele repudia a redação do fato típico. 'A Lei 9.613 melhor contempla o problema, sem dramatizá-lo. O projeto radicaliza as infrações criminais de acintosa gravidade, como sequestro, com outros de menor potencial ofensivo, como o jogo do bicho. Generaliza o delito como infração criminal para efeitos de antecedentes, o que afronta o princípio da razoabilidade, como destaca o procurador Vladimir Aras.'
Camarinha sugere 'revisão cirúrgica' na parte que alarga a área de atuação das varas. 'Haverá uma neurose judicial de que tudo é lavagem. Fundada a preocupação de juristas e advogados que avaliam que essa extensão vai levar ao fim das varas de lavagem dado o acúmulo de inquéritos e ações. Não se deve ditar a política criminal com brados dramáticos, mas com reflexão criminológica.' F.M.
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